31 julho 2011

enquanto isso / em quanto / isso / encanto / é / isso / wilson


te ligou
ligou para falar bostas
asneiras
demências
[você não deveria ouvir]
ligou porque sozinha e debilitada
quis ligar
pra te infernizar um pouco
pra te impingir
sozinha e louca
te ligou
num imbróglio
numa noite gélida
te ligou
sem roupas
triste
te ligou

30 julho 2011

a graça da coisa
soa plástica
fantástica
minha alma
nua
e
ártica
indaga
enigmática:
se na rua
a lua
crua
perguntasse
o que você quer fazer da vida
eu
vívida
em afasia
riria
e na lata
falaria:
meu amigo,
poesia

27 julho 2011

and for a moment i lose myself
wrapped up in the pleasures of the world

25 julho 2011

strolling the hills

martha
e camisas estampadas sobre o cobertor felpudo
ossos
narinas
o que temos?
mãos
braços
amor
coisas
piadas
café
jack daniels
pobres
porém, há cigarros
são franceses
martha graham
grace slick
alguma poesia
cadernos
revistas atrasadas para ler
telefone
internet 3g
cigarros
roupas quentes
velhas e feias
contos de inverno
algum secume
em algum momento

mas

a vida corre

os pássaros se protegem do frio

kisses on the run

21 julho 2011

reais #1

a paz que existe no sorriso do velhinho sentado no primeiro banco do ônibus
em seu colo uma cestinha com a placa
cocada R$1,50

dirtiest

o homem-queijo / a mulher-bala / a noite-beijo


--


solturas corporais

tal qual o cara... eu já nem me lembro seu nome

apenas que usava calça branca da levis

tomava uísque enquanto lia a playboy numa padaria da mooca

embora bom partido, era celibatário

pra tristeza das moças do bairro


--


eu aqui

com john coltrane

e uma necessidade assustadora de escrever qualquer bobagem que seja. obviamente a infância me ronda. a infância sempre me ronda.

18 julho 2011

ZILA MAMEDE

trecho apaixonante, retirado do site memória viva:


Zila nasceu em 1928, em Nova Palmeira, Paraíba, onde viveu “até cinco ou seis anos de idade” indo ao roçado do avô “comer melancia, tomate, cereja, um tomate pequeno que brotava no mato”. A família de seu pai era de Caicó, Rio Grande do Norte; o avô materno, de Jardim do Seridó, também no Rio Grande do Norte. “Por coincidência, todos foram morar em Picuí, Nova Palmeira e Pedra Lavrada”. As famílias se encontraram em Nova Palmeira, onde ela nasceu.

Ainda pequena, muda com a família para Currais Novos (RN), onde o pai monta uma máquina beneficiadora de algodão. Menina do sertão, o mar viria a ser uma forte presença em sua poesia. A primeira vez que o viu foi por volta dos doze ou treze anos, aquela coisa “balançando de um lado para o outro, uma coisa que eu jamais havia visto”:

“- Meu pai, isso é o mar?
Ele disse:
Não. Isso é um canavial”.

Estavam em um Ford 39, a caminho de Recife, onde ela finalmente veria o mar.

demência has arrived

senhoras e senhores,

pintamos as paredes da casa. somos móveis. somos táxis mentais que circulam pela cidade suja. pães bolorentos não terão suas vidinhas facilitadas. agradecemos a compreensão.


A DIRETORIA
organização desgovernamentada sem fins lucrativos débora lopes

sobre pessoas

em certo momento da vida as pessoas desaprendem a lidar com humanos.
elas passam a lidar com gado.

não

são
queixas
não
são
deixas
é somente
um
horizonte
contraído
de menino

quando
deu-se
fez-se
ralou-se
o queijo
agora
moído
a cair
em tempestades
por cima
do
meu
macarrão

são
apenas
meus versinhos
coisa tímida
de menina

é
somente
o
meu
secume
um verso
torto
santo
e
torpe

uma
atroada
uma
topada
com
a
cara
na
tampa
quente
da
panela

são
ossos
reciclados
ócios
bem
muito
muito
bem
bolados



é somente
uma fumaça

lá longe

por trás
do trem
que vai embora
nessas linhas

17 julho 2011

poesia é bobagem

tem que ser mais fluente
pensei
tem que ter mais ginga
uma coisa assim
que sai
sem ser parida

que hoje
discuti marx com meu irmão
e discuti a revista veja com meu pai
discuti sem nenhuma poesia
(de minha parte)

pois poesia é pedra
nasce torta
cuspida

doa-se a dúvida

tomei pra mim essa coisa maternal
essa nuance
com a possibilidade
de exalar
um cheiro de anjo
e é errado
é erradíssimo

além do mais
devo lhe dizer
que odeio
mortalmente
o barulho dos aviões
a passar
por cima de minha cabeça
e minha casa



a arte acima pertence a mo toledo, artista plástico
filho de amélia toledo, artista plástica
que é mãe de ruth toledo, artista plástica
que é ex-mulher do meu ex-chefe du ribeiro
que é fotógrafo
além de ser uma pessoa maravilhosa

16 julho 2011

Você demora, amor

Os fios de cabelo são castanhos e tocam, estrategicamente, os ombros - que neste momento estão nus, a espera do vestido azul marinho. Os sapatos também já foram escolhidos. São vermelhos, recém comprados em um brechó ao lado de uma loja de roupas para travestis no Baixo Augusta. O dedinho do pé direito está um pouco machucado e para encarar o sapato "novo", ela reveste a pele com uma pomada cicatrizante e em seguida fixa, delicamente, um band-aid. Os gestos são todos leves, assim como sua alma, que vive um dia de paz.

Escova os dentes balançando a cabeça ao som de uma música imaginária. Ah, é verdade, ela pensa, essa é a música do filme que vi ontem. Enquanto isso, ao espelho, sabe que está bonita e que nenhum homem resistiria ao caimento do vestido que, embora deixe-a com um aspecto de menina, mostra suas pernas, que são de mulher. Seus olhos castanhos parecem duas amêndoas densas, profundas, capazes de guiar qualquer ser masculino ao mais terrível dos infernos.

Hidrata a pele do rosto e começa as escolher as cores da maquiagem. Nos olhos, opta pelo preto, clássico, esfumaçado e muito rímel. Nas bochechas, um tom delicado de laranja a deixa com um aspecto natural de verão. Um batom cor de boca, apenas para hidratar os lábios e está pronta.

Cogita ir ao espelho grande e desiste. Sem nada mais para fazer, passa a fustigar sua mente com pensamentos ruins pois sabe que neste exato momento, ali, pronta, sozinha no apartamento, depende de um único homem. Um homem que virá buscá-la para tirar suas roupas e fazerem amor.

Retira, agora sem a delicadeza de antes, uma maçã da fruteira e morde-a com violência. Está com raiva. Tem a certeza da dependência e este simples fato lhe dói e ofende. Além do mais, ama-o com toda sua loucura, todas suas razões e desrazões. Quer vê-lo, quer fazer amor violentamente. Espera que ele rasgue seu vestido e suas roupas íntimas. Começa a pensar em muitas coisas e já desconhece a mulher cheia de paz que parecia ser minutos atrás. Ele está atrasado.

Anda pelo apartamento atormentada. Já tirou o sapato e seus pés estão com as solas pretas. O olho direito deixa escapar uma lágrima raivosa, estragando parte da maquiagem. Fios de maçã se instalam em seus dentes. Está triste. Triste e um tanto adoecida. Está decepcionada. O telefone não tocou, não há recados, sinais. Tem vontade de sair na rua e dizer a qualquer homem "me coma" só para não perder a viagem, o vestido e o tempo gasto com a maquiagem.

Deita na cama e levanta o vestido azul marinho, triste e lasciva. Com as coxas à mostra, esfrega o corpo no colchão e usa os quadris com ritmo. Vai fundo em si mesma. A cabeça, desesperada, para um lado e para outro. E prestes a chegar ao fim, quando sente-se livre e já nem pensa nele, toca a campainha.

14 julho 2011

coisas de bairro

despreocupei

seis horas: ok.

as pálpebras sempre resistem

--

ouço gemidos pela janela
achei que fosse um travesti
depois concluí ser uma mulher

eu não sei o que tem neste quarteirão.

já vi de tudo:
um apartamento pegar fogo;
um fio elétrico se estrebuchar e depois derreter um táxi;
há também uma ratazana noturna que emite sons
sons malucos
e sempre que ela emite esses sons eu vou pra janela
observo-a comendo o lixo da calçada
e fico pensando que a natureza dos ratos é nojenta
a rapidez, o rabo
embora eles não tenham culpa;


num outra noite, ouvi uma menina chorando desesperadamente, loucamente
chorando pra caralho
sentada na calçada
passando mal de tanto chorar
até que uma senhora, preocupada, parou o carro e perguntou se podia levá-la pra casa
era tarde da noite já
fiquei na janela observando, não podia fazer muita coisa
a menina disse que não queria
que alguém de sua família estava a caminho
um segurança se aproximou e pediu que ela ficasse perto dele
já que "a rua é perigosa"
ela o seguiu
chorando

e eu fiz o que melhor sei fazer
que é observar

--

esses dias sonhei com gatos e galinhas

e que minha mãe estava milionária

eu pensava: agora que minha mãe está milionária posso ter muitos gatos

fazia muito sentido. mas havia uma porta e os gatos estavam atrás dela. toda vez que eu tentava pegar um gato, vinha uma galinha.

--

queria jogar no bicho.

mas esses dias meu pai me contou que um camarada dele lá da mooca, que trabalhava com jogo do bicho, sumiu. sumiu pois alguém jogou num bicho e deu grana. o cara, ao invés de pagar o prêmio, simplesmente sumiu.

eu gosto muito dessas coisas bairristas.

que no fundo a vida é meio assim, permeada por provincianidades.

04 julho 2011

nobody

bem cansada de ser tão humana
bem casada de ser tão fulana
a moça da fala não tão enobrecedora assim

e "foda-se"? parece que não sei mais mandar alguém ir se foder
um bom "vá se foder"
com a boca cheia
e saborosa


que
meus cabelos nunca foram tão desgrenhadamente enrolados
e, diga-se, livres

a maquiagem sei que é bobeira, mas minha descendência libanesa atrapalha
às vezes penso: será que um dia deixarei de passar corretivo?

a maquiagem corrige as olheiras
mas não corrige a tristeza
que os olhos carregam


não estou triste hoje.
apenas pensando. pensar dói, sabemos.
mas pensar engrandece.
conheço alguns acolhidos no universo-em-ordem
a vida que me livre deste vício horrendo!
por favor - imploro

a impressão é que sempre sofrerei
mas depois de (quantos meses, anos? não sei) um bom tempo
meu violão retornou
posso fazer música!
sofrer com o violão é sofrer menos
tristeza que dá resultado vira música
tristeza produtiva

vânia, o gato era você
o gato era você
você
vânia

after twenty years, who are you?
"nobody"